Thursday, April 20, 2006

Livro de Horas...

Aqui diante de mim,
Eu, pecador, me confesso
De ser assim como sou.
Me confesso o bom e o mau
Que vão ao leme da nau
Nesta deriva em que vou.

Me confesso
Possesso
Das virtudes teologais,
Que são três,
E dos pecados mortais,

Que são sete,
Quando a terra não repete
Que são mais.

Me confesso
O dono das minhas horas
O dos facadas cegas e raivosas,
E o das ternuras lúcidas e mansas.
E de ser de qualquer modo

Andanças
Do mesmo todo.

Me confesso de ser charco
E luar de charco, à mistura.
De ser a corda do arco
Que atira setas acima
E abaixo da minha altura.
Me confesso de ser tudo

Que possa nascer em mim.
De ter raízes no chão
Desta minha condição.
Me confesso de Abel e de Caim.

Me confesso de ser Homem.
De ser um anjo caído
Do tal céu que Deus governa;
De ser um monstro saído
Do buraco mais fundo da caverna.
Me confesso de ser eu.

Eu, tal e qual como vim
Para dizer que sou eu
Aqui, diante de mim!

Miguel Torga


Lembrei-me deste Poema de Miguel Torga quando pensava numa querida amiga minha que passa agora uma fase dificil na busca da sua felicidade. Talvez lendo as palavras deste grande poeta consiga compreender que todos somos pecadores e que a felicidade é uma luz que temos que perseguir e deixar que nos ilumine porque sem esse calor ficamos frios, com o corpo e a mente dormente, como que insensíveis ao toque.

1 comment:

Anonymous said...

:)...